Por Jurgen Souza

Não se pode negar que sempre houve, entre cristãos e muçulmanos, um discurso intolerante de ambas as partes, ainda que tanto a Bíblia quanto o Alcorão apresentem a figura de um Deus clemente, misericordioso e pacífico. Em nome de Deus, inúmeras ações violentas foram realizadas por cristãos e por muçulmanos ao longo da história, amparadas tão somente no pensamento discriminatório de que os “infiéis” – ou seja, os que não compartilham da mesma religião – deveriam ser punidos. Todavia, esse ambiente de intolerância ficou ainda mais latente após os atentados de 11 de setembro de 2001, chegando ao ponto de o então presidente norte-americano George W. Bush usar o termo “Cruzada” para a guerra contra o terrorismo, como se não soubéssemos que as Cruzadas foram um lamentável episódio da história da humanidade (entre os séculos XII e XIII) em que todos os povos que não se declarassem cristãos e aceitassem os ditames da igreja eram dominados e, por vezes, exterminados em nome de Deus.
Os níveis de intolerância religiosa desencadeados pelos atentados de 11 de setembro de 2001 conduziram muitos especialistas no assunto a cogitar uma hecatombe religiosa, uma vez que os discursos de uns e de outros se tornaram cada vez mais ácidos. Enquanto os norte-americanos passaram a se entender como os verdadeiros representantes de um cristianismo que “deu certo” e de um Deus que demonstrava seu poder pela riqueza dos que se dizem seus seguidores – ainda que isso custasse a opressão de muitos outros povos –, os muçulmanos mais radicais foram levados a crer que Alá finalmente estava dando a eles uma oportunidade de derrotar, de uma vez por todas, o “grande Satã” que parecia impedir os povos islâmicos de se tornarem potências econômicas, demonstrando assim o poder de um Deus vingativo e opressor. Por conta desse pensamento, tanto os 2.996 norte-americanos mortos nos atentados de 11 de setembro de 2001 quanto os mais de 80.000 muçulmanos civis mortos nas guerras contra o terrorismo no Iraque e no Afeganistão foram, na verdade, vítimas de uma cada vez mais declarada intolerância religiosa.
Apesar de serem válidos os muitos documentários e os inúmeros debates acerca das consequências perceptíveis dos atentados de dez anos atrás para a economia ou para a política mundial, não se pode fechar os olhos para o desrespeito à diversidade religiosa que o 11 de setembro de 2001 nos deixou como herança nefasta. Em virtude de tamanha intolerância é que, mesmo que pareça assustador admitir, tem sido considerado lícito desejar, planejar e executar o extermínio daqueles que não professam a mesma fé, ainda que se tente forjar uma outra legitimação mais “aceitável” para quem se recusa a enxergar o óbvio. Nenhuma sociedade verdadeiramente desenvolvida pode aceitar como naturais as amarras do desrespeito à diversidade, já que, no mundo plural para o qual o século XXI tem apontado, pensamentos e ações intolerantes para com o diferente ferem o princípio do respeito ao outro e às suas escolhas, sem o qual será impossível conviver de maneira pacífica onde quer que estejamos.